sexta-feira, março 24, 2006

Retomando os links...

... volto a ter oportunidade de divulgar o trabalho de alguém que, à semelhança do anteriormente mencionado David Soares, reflecte sobre obras e assuntos relacionados com o Fantástico.

Jorge Martins Rosa é professor na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, sendo responsável por cadeiras ligadas às Ciências da Comunicação.
Durante a sua carreira académica tem tido oportunidade de abordar temáticas associadas à Cibercultura, aos jogos de computador, e à Ficção Científica, principalmente no que se refere à obra de Philip K. Dick.

A página pessoal do Jorge permite o acesso a um número considerável de artigos de imprensa e transcrições de apresentações orais da sua autoria, assim como outros recursos.

Um site muito bem estruturado, bastante enriquecido pelo conteúdo. A consultar.

quinta-feira, março 16, 2006

Foi você que pediu uma série de FC a sério?

Se disser que a série original da Battlestar Galactica foi um dos meus fascínios de infância, nem vale a pena dizer qual a minha idade.

É inevitável que olhe para a série original com um sorriso bem-disposto. Pelos anos que já passaram; pelo aspecto datado de cenários, guarda-roupa, dos desajeitadamente mecânicos cylons; pelo argumento linear de FC militarista.

Cerca de vinte anos depois do original, o canal SciFi lançou-se em 2003 na empreitada de relançar o conceito. Talvez por intervenção dos Deuses de Kobol, o resultado está muito longe do que se poderia esperar!

Quem tenha visto o episódio piloto da primeira época, exibido há poucos meses na SIC, terá reparado que a essência da história se manteve, mas que os personagens foram imensamente modificados.
Ok, já todos devem saber a celeuma que foi criada à volta do facto do Starbuck ser agora uma mulher. Meus caros, engulam e agradeçam aos Deuses. Um dos grandes atributos desta nova série é o equilíbrio que consegue entre personagens masculinas e femininas.
Apolo x Starbuck, Adama x Lora Roslin (Presidente das 12 Colónias), Dualla e Kelly x Billy e Chefe Tyrol, Helo e Gaius Baltar x Sharon e Número Seis.
Tornou-se já claro que o conceito de humanidade e de nascimento são duas das ideias a discutir nesta série. Tal seria impossível fazer com um elenco tendencialmente masculino.
E essas últimas duas personagens serem na realidade cylons é outra das inovações essenciais. Alguns dos cylons têm agora o aspecto de humanos... e muitas vezes revelam emoções mais "humanas" que os seus opositores. Para além disso, são agora eles que parecem seguir desígnios divinos!

Estas, e outras, histórias tem dado pano para mangas. A série vai já na segunda época (com uma terceira a ser iniciada em Outubro), tem alturas mais dinâmicas e alturas mais contemplativas,
as batalhas são raras mas esplêndidas, os personagens imperfeitos... e, devido a isso, mais realistas que antes (nota especial para o novo Gaius Baltar, o paradigma da imprevisibilidade do ser humano e dos factores que a podem reger).

"Did you really expect some utopian fantasy to rise from the ashes?"

Este comentário do conselheiro Tom Zarek, um ex-recluso político radical, ao capitão Lee Adama (2ª época, episódio 14), espelha o que penso ser o espírito desta nova versão da Galactica: um exercício distópico.

E para quem (como eu!) dá importância a que a Ficção Científica tenha algo de científico, aconselho o artigo de Wil McCarthy (na coluna Lab Notes, do Science Fiction Weekly) sobre os pormenores científicos da série, aqui.

Nota final: Esta nova série é também servida por uma banda sonora acima da média, da autoria de Bear McCreary. Podem encontrar já dois volumes: o da mini-série e o da 1ª época.

segunda-feira, março 13, 2006

O Mundo nos seus ouvidos


O senhor à esquerda aguarda as vossas sugestões de Podcasts relacionados com o Fantástico!

quarta-feira, março 08, 2006

Lord Dunsany, a propósito de Religião...

[...]And the Captain answered that he came from fair Belzoond, and worshiped gods that were the least and humblest, who seldom sent the famine or the thunder, and were easily appeased with little battles.[...]

Lord Dunsany, At the Edge of the World (editado por Lin Carter)

E a esse propósito, deixem-me referir a excelente palestra "Science Fiction & Religion: An Interface for Writers" ocorrida durante o workshop de escrita fantástica no Fórum Fantástico 2005.
O palestrante, Neil Hook, é ao mesmo tempo pastor anglicano e investigador na área da Ciência e Cultura, presentemente na Universidade de Glamorgan.
"Servida" por um excelente comunicador, estremamente simpático e flexível com as intervenções da audiência, a palestra teve como tópicos fortes a diferença entre Fé (um sentimento pessoal) e a Religião (a organização que pode "formatar" a Fé), e o pouco cuidado que a maior parte dos autores presta à Fé.
Realmente, quando se criam mundos, através da sua geografia, clima, sistemas políticos e económicos, panteões de deuses, etc, geralmente as religiões são aplicadas como rótulos pré-formatados. Raramente os autores exploram as diferentes matizes de Fé dos personagens.

Nesse aspecto, Lord Dunsany está a ser uma leitura muito interessante (agradecimentos ao Jorge Martins Rosa pela oferta do livro). Aliás, tendo sido uma influência tão marcante nos restantes autores de fantasia do século XX, admiro-me que a sua deliciosa inventividade sobre os deuses, as cidades e o Tempo não tenha sido mais copiada.

domingo, março 05, 2006

O Sonho de Newton


Não será porventura a melhor altura para divulgar este blog, dado o autor andar a terminar alguns projectos offline, mas quis começar com chave de ouro (e, além disso, lá estão os arquivos, que recuam até Agosto de 2003, recheados de "tesouros" por descobrir) a adição de ligações alheias alí à coluna da direita.

O Sonho de Newton é o blog do autor David Soares.

Começar por definir o David Soares como "autor" soa-me imediatamente redutor. Contos, banda-desenhada (tanto desenho como argumento), ensaio, vários são os campos onde ele se move, mas é a maneira como o faz que me faz hesitar entre os adjectivos "criador" e "pensador".

Como dizia o Estripador, vamos por partes...

David Soares começou por estabelecer o seu nome na banda-desenhada, tendo já vários álbuns e prémios. Por ser a sua vertente artística que menos conheço, não farei mais considerações.

Quanto aos livros de contos, diria que tanto a escrita como o ambiente criado os inserem no Horror. Um horror orgânico e poético que deriva muitas vezes do âmago emocional e físico das personagens. A estrutura narrativa criada é competente e o conteúdo imaginativo.
Mais, a sua consciência do género faz com que seja um caso raro em Portugal (talvez por isso o escritor João Barreiros o interpelava recentemente, no lançamento do seu último livro Os Ossos do Arco-Íris, lançando a questão sobre porque não haveria mais gente em Portugal a escrever dentro do Horror. Provavelmente haverá, mas sem uma percepção tão clara do terreno que pisam).
Dentro do género de um Horror urbano, creio encontrar várias semelhanças entre a obra de David Soares e a de Stephen King, muito mais do que com a de Clive Barker. O segundo assume mais a condição de fantasia das histórias que tece, enquanto Stephen King nunca parece deixar escapar a dimensão "realista" das suas personagens, por mais incríveis que sejam as suas aventuras. Ora, é esse sentido de "realismo humano" que parece também nunca abandonar as personagens de David Soares.

No entanto, nem tudo são rosas.
Do ponto de vista técnico, os seus contos não atingiram ainda (e abro uma ressalva para dizer que não li o seu último livro!) o apuro da sua lógica narrativa. Existem por vezes demasiadas repetições frásicas, muitas metafóricas, que despertam irritantes sentimentos pontuais de dejá vu.

Mas se como contista se pode sentir que assistimos a um "trabalho em evolução", como ensaísta, David Soares revela ter já atingido um estado superior de arte. Pela erudição que demonstra, e principalmente pela capacidade de tecer dados de várias fontes, num reflexo da nossa realidade multi-media.
Impresso, o melhor exemplo será Sobre BD, à superfície uma colectânea de resenhas sobre várias obras de banda-desenhada, mas no interior o leitor irá encontrar verdadeiros ensaios, mais uma vez mostrando a capacidade da literatura fantástica tratar de assuntos bem reais.

O Sonho de Newton é a faceta online do David Soares como ensaísta e cronista. Cobrindo um vasto leque de assuntos, os posts são sempre densamente informativos... e opinativos. Com a profundidade que só se obtém através da ponderação das matérias.
Em resumo, de leitura essencial.

sábado, março 04, 2006

O Povo do Livro

Ao longo dos tempos, três grandes religiões - Judaísmo, Cristianismo e Islão - têm-se tratado, ao nível dos Estados, com uma tolerância variável e geralmente fortemente cobrada ou opressiva. No entanto, essa propalada intolerância contrastou durante muitos séculos com a proibição com que encararam a prática de qualquer outra religião nos seus territórios. Para esse facto contribuiu as afinidades entre elas, também de textos sagrados: a Tora, a Bíblia e o Corão. Daí apelidarem-se por vezes como Os Povos do Livro.

Vem isto a propósito da Locus - The Magazine of the Science Fiction & Fantasy Field, no fundo o que a ficção especulativa mais perto tem d'O Livro.
Não O Livro na mesma acepção de texto sagrado, mas sim no sentido de ser um meio privilegiado para tomar constantemente o pulso ao campo e ao seu desenvolvimento.
Fundada em 1968 por Charles N. Brown, o seu editor-reformado-ainda-em-actividade, a revista começou como uma publicação de apoio à candidatura de Boston à Worldcon. Durante todos estes anos, tornou-se uma referência, ao mesmo tempo recusando fechar-se no gueto e assumindo a sua ligação ao género.
A isso ajuda a estrutura da revista. Entrevistas, resenhas, notícias e listagens de livros. O seu maior defeito será o foco primário no mercado anglófono (que, honestamente, continua a ser o coração do género!), o que tenta mitigar com artigos periódicos sobre a actividade editorial e do fandom de outros países pelo mundo (Israel, Brasil, Bulgária, México, etc). E todos os anos, no número de Fevereiro, o balanço do ano anterior e uma lista das obras a ter em consideração.